28 agosto 2020

Branco sobre branco

 Dia 28 de agosto de 2020    

    Eu não queria que você me lesse. Por isso a ocultação desse texto pouco inspirado. Ao mesmo tempo, se escrevi, é porque eu queria, sim, seus olhos sobrevoando linha após linha, sua boca fazendo movimentos mudos enquanto a sua mente — e não os seus lábios —as lê.

    Nós somos seres tão voláteis, não é mesmo? Queremos desquerendo. Evitamos nos aproximando. Caetano já sabe há muito tempo da complexidade de nossos quereres. Ok, não vou generalizar como sempre faço, com a intenção inconsciente — ou não — de deixar este texto mais impessoal. Dessa vez, tentarei não me ocultar de forma covarde sob os pensamentos de um personagem fictício. Esse texto é sobre mim, não sobre os outros. Por isso, vou assumir minha própria indecisão e deixar que os outro assumam as deles. Eu não sei o que quero. Eu não sei nem se quero.

    “Eu quero a sorte de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida”, disse Cazuza em certa canção. Uma fruta mordida não faz com que você crie expectativas em excesso. Uma fruta mordida é o que ela é. Você já sabe o seu gosto, o quanto de suco ela possui, o quão madura ou não ela está. Sem surpresas, sem aqueles questionamentos irritantes de “será que...?” que fazemos antes de experimentá-la.

    Eu não sei se quero a fruta mordida. Não sei se quero a fruta inteira. As vezes me encontro querendo um meio termo. Mas o que é um meio termo entre a fruta inteira e a mordida? Pra piorar, você também não sabe o que quer. Na verdade, minhas dúvidas são até mais certas que qualquer afirmação já saída de sua boca. “Vamos nos ver tal dia”, você disse. “Quero que permaneça em minha vida”, você afirmou. Você não sabe que quando se conjuga o verbo amar pra alguém a gente tende a acreditar? É que não dá pra amar em um dia e no outro ocultar esse sentimento como se fosse possível descolori-lo.

    Eu não sei o que quero. Você também não. Você acha que sabe, mas eu sei que não. E é justamente no espaço entre minhas dúvidas certas e suas certezas oscilantes que vamos regando pequenas raízes de decepções. É na falta de trocas que nasce a indiferença. É na ausência de novas linhas que o nosso texto vai se desbotando, vagarosamente, até perder completamente a cor e sumir.

        Sumir exatamente como este texto em branco que nunca será lido por ninguém.


1 Comentários:

Lucas Eliel - Devocional disse...

Refletindo sobre a sua postagem, sobre a sua descrição do blog e sobre esta frase: "E quando eu me pergunto quem sou eu, sou o que pergunta ou o que não sabe a resposta?". Obrigado por me levar a um lugar desconhecido com o seu blog, Dan!